Na faculdade da vida, somos todos bixos


Não se engane, este é um post sem imagens.


Nos últimos dias me envolvi numa discussão com alguns amigos professores que, depois, se estendeu para um grupo de alunos. O tema era simples: o trote nas universidades. Pra quem não sabe, o trote universitário constitui-se numa tradição inerente a grande parte dos centros acadêmicos, cujo surgimento remonta a Idade Média. A discussão começou quando alguns defendiam a tese de que o trote é como um "ritual de passagem". Achar que o trote visa apenas a recepção calorosa dos calouros ou "bixos" é, no mínimo, esconder pra debaixo do tapete um problema muito maior. É o que diz o Butuca Ligada nesse post. Entendo que o que torna problemático é a desvirtuação das formas de integração aplicadas.
São, muitas vezes, empregados castigos e punições que ao invés de alegria e divertimento, acabam em violências e traumas.
Quer dizer que o cara estuda por vários anos, faz mais um de cursinho, passa no vestibular e é premiado com um banho de lama, tinta, uma bebedeira forçada, corte de cabelo e diversas situações constrangedoras? Hoje no Twitter alguém, ao citar os recentes protestos na USP, relembrou a frase "democracia é quando você faz o que eu quero; ditadura é quando faço o que você quer". As imposições por parte dos veteranos a fim de que o calouro se inclua no grupo social são uma forma ditatorial de mostrar a dominação sobre o "mais fraco". Segundo um professor da UFSCar, a prática já era presente nas universidades medievais. Lá, no entanto, o ato de raspar os cabelos e retirar e queimar as roupas era tido como medida profilática, evitando a propagação de doenças. Assim, o que se dava em função da manutenção da saúde foi incorporado como forma necessária de aceitação dos recém chegados, visto que provavelmente, proporcionava diversão àqueles responsáveis pela aplicação.
É incrível como ainda existem alunos que veem o trote como oportunidade de se festejar a conquista, conhecendo pessoas novas e se expondo alegremente ao ridículo.
Eu, no entanto, não sei como pegar dinheiro num semáforo pode contribuir para a integração no novo universitário ao curso que irá cursar. Talvez minha visão esteja tolhida por minha aversão a qualquer tipo de brincadeira que me exponha de alguma forma, mas que é difícil acreditar que seja simples assim pra mim é. Quem é favorável à manutenção dessa prática talvez não conheça o caso da aluna Priscila Vieira Rezende Muniz, que, ao chegar à faculdade, foi abordada com ameaças e teve uma mistura de gasolina e creolina nela atirada, sofrendo lesões e queimaduras. Ninguém sabia que ela estava grávida, mas o fato de pedir pra não participar não foi suficiente para parar a veterana do curso de Pedagogia, autora do trote. Quem não se lembra também do calouro do curso de Medicina encontrado morto numa piscina na manhã seguinte a uma festa de recepção no grêmio da universidade? E os outros casos? É simples. Da mesma forma como há os que aplicam os trotes e aqueles que esperam ansiosos por esse momento, há os outros que não querem de forma nenhuma participar disso. É chavão, mas o direito dos veteranos acaba quando começa o direito dos calouros.

Você já parou pra pensar por que o nome disso é trote? E por que a palavra bixo é escrita com X?

3 comentários

Professor, passei pra te dar os parabéns pelo novo layout. Ficou muito bom ;)

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Trote é algo humilhante para quem está sofrendo.

Um detalhe: Nós professores do Estado sofremos um trote contínuo de mais de dez anos com esse governo do PSDB. Sinto-me hunmilhado toda vez que pego o hollerith e vejo o meu salário! :o)

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Realmente, @Cidão, quem sofre está exposto sem defesa nenhuma. É o tipo de coisa que me faz ficar feliz por não ter uma arma. Sempre condenei quem tirava uma licença atrás da outra, faltava para ir ao médico. Sabe que começo a entender quem faz isso, viu.

@Juliana, gostei do resultado também. Acho que estou no caminho certo. Se bem que não dá pra ficar longe dele seguindo um monte de gente legal por aí.

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