Homilética escrita


Li recentemente um artigo no qual o autor, profº Isaltino Gomes, falava sobre a homilética escrita. Numa época em que os "novos" políticos acabaram de assumir os cargos para que foram eleitos, questionar os recursos usados por eles diariamente é mais que salutar.
Partindo do texto de Jô Soares, o autor questiona aqueles que discursam sem nenhum objetivo, ou melhor, aqueles que discursam com o “claro objetivo” de não serem claros.
Leia o texto a que me refiro:

Da arte de falar bem sem dizer nada
"Quando fui convidado para homenagear com um discurso neste digníssimo banquete o meu prezado amigo cujo nome agora me falha a memória, achei imediatamente, depois de pensar muito que eu era sem dúvida a pessoa indicada, a não ser naturalmente que outro orador fosse escolhido. Desde criança, foi o homenageado um dos mais categorizados elementos, tendo muito mais talento e inteligência do que todos os que eram menos dotados do que ele. Neto de seus avós, o homenageado é também filho de seus pais, pertencendo desde cedo à sua família. Veio ao mundo na sua cidade natal, exatamente no dia do seu aniversário. Em menino, era membro ativo da infância, tendo passado para a adolescência na puberdade. Depois disso, ficou adulto, e, num rasgo cronológico, atingiu a maioridade aos 21 anos.
Homem de várias habilidades, é perito naquilo que de melhor faz. Sua memória é tão fantástica que ele se lembra nitidamente de tudo aquilo que não esqueceu.
É uma pessoa de temperamento suave, a não ser quando se exalta, e só se cansa em momentos de exaustão. Domina com perfeição todas as línguas que fala sem dificuldades e quando conversa usa sempre a palavra, deixando apenas para redigir tudo aquilo que escreve. Conhece todas as partes do mundo a não ser os lugares onde nunca esteve. Além disso, quando labuta, trabalha.
Finalmente, devo revelar que no ano passado, neste mesmo dia, este meu caríssimo amigo era dois anos mais moço do que será no ano que vem. Não quero ser profeta, mas guardem bem as minhas palavras: de hoje a uma década, o homenageado verá que dez anos ter-se-ão passado.
Obrigado” (sic).
Jô Soares, em "O astronauta sem regime", pp. 81-82

No ano de 2006, como aluno-especial, assisti às aulas da profª Drª Eni Orlandi. Por muitas vezes, inclusive em exemplos dados em classe, questionou-se o modelo discursivo das igrejas, geralmente, evangélicas. Em sua imensa maioria, valoriza-se a retórica em detrimento do conhecimento. Quantas são as que nasceram a partir de alguém que diz ter tido uma revelação divina, mas que, na verdade, apenas treinou (colocar o vídeo do Edir Macedo) para falar bem.
No artigo a que me referi inicialmente dizia ainda que um número muito grande de discursos evangélicos se assemelha a este texto de Jô Soares: “um palavrório incrível sem que nada de substancioso tenha sido dito.”
Dizer-me, leitor, que este texto trata de religião e que este espaço deveria tratar de questões da língua seria simplista demais. O “dizer” e o “nãodizer” são faces da mesma moeda (perdoe-me pelo chavão). Mais ainda, escrever sem objetivo e exagerar nas palavras é tão grave quanto achar que o leitor tem a obrigação de entender algo que está apenas na cabeça do escritor. É justamente esse ponto que tangencia o blog. Escrever é prática e estudo. Por isso, observe as tags que se referem à Língua Portuguesa e as que apresentam dicas para escrever melhor.

[UPDATE] Leia o arquivo que deu origem a esse post baixando-o AQUI.

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